Por Wellington Sampaio
Advogado especializado em Direito Condominial
A mobilidade elétrica deixou de ser uma tendência para se tornar uma realidade em nossas cidades. Com o avanço da frota de veículos híbridos e elétricos, é inevitável que condomínios residenciais e comerciais se tornem parte desse ecossistema. Nesse contexto, a recente Lei Municipal nº 11.575/2025, sancionada em 29 de setembro de 2025, marca um divisor de águas em Fortaleza ao regulamentar a instalação de pontos de recarga de veículos elétricos em condomínios e estacionamentos privados de uso comum.
A iniciativa coloca Fortaleza entre as capitais que mais avançam na modernização da infraestrutura condominial, ao mesmo tempo em que impõe novos desafios jurídicos, técnicos e administrativos para síndicos, gestores e profissionais da engenharia elétrica.
Normas técnicas: segurança e conformidade como pilares
Um dos principais méritos da nova lei é vincular a instalação dos carregadores ao cumprimento rigoroso de normas técnicas e de segurança. O texto exige que toda a infraestrutura elétrica de recarga siga as diretrizes da ABNT, da concessionária de energia local, das normas de segurança contra incêndios e das orientações do Inmetro.
Entre as normas mais relevantes, destacam-se:
- ABNT NBR 5410, que define as condições mínimas de segurança para instalações elétricas de baixa tensão;
- ABNT NBR 17019, que trata especificamente da alimentação de veículos elétricos;
- ABNT NBR IEC 61851-1, sobre sistemas de recarga condutiva;
- e ABNT NBR 7195, que orienta a sinalização de segurança.
A lei também determina que apenas profissionais ou empresas habilitadas, com emissão de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) e laudo de conformidade, possam realizar a instalação e manutenção desses sistemas. Trata-se de uma medida essencial para evitar improvisações, que poderiam representar sérios riscos à segurança e à coletividade.
Proteção elétrica, ventilação e prevenção de riscos
A legislação vai além do aspecto técnico e alcança o campo da segurança estrutural e operacional. O Artigo 9º obriga que os carregadores contem com sistemas de proteção contra choques, surtos, sobrecargas e curtos-circuitos, além de prever a presença de *equipamentos de combate a incêndio nas proximidades.
Outro ponto de destaque é o Artigo 10, que exige que a instalação ocorra em locais ventilados, prevenindo o superaquecimento e garantindo a dissipação térmica adequada. Detalhes como afastamento mínimo das paredes, ausência de obstáculos físicos e o uso de materiais não inflamáveis tornam-se obrigatórios.
Em outras palavras, o ambiente da instalação é tão relevante quanto a qualidade técnica do equipamento — uma abordagem que revela o amadurecimento normativo da legislação municipal.
Manutenção periódica e responsabilidade continuada
A lei também introduz um importante aspecto de gestão preventiva. Os Artigos 15 e 16 impõem a manutenção periódica dos sistemas, conforme recomendações do fabricante e das normas vigentes. O responsável técnico deve realizar inspeções regulares e emitir laudos de funcionamento seguro.
De forma ainda mais incisiva, o Artigo 17 estabelece que eventuais irregularidades devem ser corrigidas em até 30 dias, sob pena de interdição do ponto de recarga. Isso impõe aos síndicos e administradores a necessidade de uma postura proativa e técnica, sob pena de responderem por omissão em caso de sinistro.
Responsabilidade civil e criminal: um alerta para todos os envolvidos
A responsabilidade civil e criminal prevista no Artigo 19 é outro ponto que merece atenção. Em caso de acidentes resultantes de instalação ou uso inadequado, tanto o responsável técnico quanto o proprietário do equipamento podem responder judicialmente.
Essa previsão legal reforça a importância de se contratar profissionais qualificados e de documentar cada etapa do processo — desde o projeto até a execução e manutenção — como forma de mitigação de riscos e proteção jurídica do condomínio.
Assembleia condominial e autonomia decisória
A lei também valoriza a autonomia condominial, ao permitir que as regras de uso, manutenção e rateio dos custos sejam definidas em assembleia. Os Artigos 14 e 20 autorizam expressamente que os condôminos deliberem sobre o uso compartilhado dos carregadores e sobre as formas de cobrança pelos serviços.
Importante destacar que o condomínio não pode negar a instalação, salvo quando houver impossibilidade técnica comprovada por laudo. E, embora a legislação não fixe quórum específico, o entendimento jurídico dominante é que, na ausência de previsão convencional, aplica-se a maioria simples para aprovação em assembleia.
Um novo horizonte para a sustentabilidade condominial
A regulamentação da Lei nº 11.575/2025 vai muito além da mera instalação de equipamentos elétricos. Ela inaugura um novo paradigma de gestão condominial sustentável, pautado pela segurança técnica, pela responsabilidade jurídica e pelo compromisso ambiental.
Os condomínios, que historicamente enfrentaram desafios na adaptação a novas tecnologias, agora têm uma oportunidade concreta de se posicionar como agentes de inovação urbana.
Mais do que uma obrigação legal, trata-se de um convite à modernização consciente — um passo firme rumo à integração entre mobilidade elétrica, segurança e sustentabilidade.
Sobre o autor
Wellington Sampaio é advogado especializado em Direito Condominial, autor de livros sobre gestão condominial e consultor jurídico em condomínios e associações. Atua nos estados do Ceará e São Paulo, com foco em inovação e governança condominial.
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